"Eu só acreditei depois que vi", conta o agricultor Arnoldo Ribeiro. Viu e acabou escapando por um triz. O encontro com a onça-pintada deixou marcas. Primeiro, ele viu o filhote dentro de um buraco no paredão. "Era um filhote de onça! Meu cunhado, que estava fora, disse que havia o rastro de um cachorro. Eu disse que não era de um cachorro porque ainda está o mau cheiro da urina dela. O filhote tinha mais ou menos três dias de nascido", lembra. saiba mais
Equipe enfrenta a Caatinga em busca da onça-pintada
Enquanto Arnoldo admirava o filhote, mal sabia que também estava sendo observado pela mãe superprotetora. Ele levou um susto. "Eu escorreguei tentando correr e caí. Quando eu percebi, ela vinha com a boca aberta para pegar meu pescoço. Foi Deus que ajudou, porque eu caí e ela bateu nas minhas costas, me escorei com meu braço, o rosto no chão, caí só com o peso dela. Depois que ela me atacou, voltou para dentro da fenda. Ela só estava defendendo o filhote, que parecia um cabrito recém-nascido", lembra o agricultor.
"Nós sabemos que eles estão aqui. O desafio é chegar até o animal", diz o biólogo do Instituto Onça-Pintada, Leandro Silveira.
As fotos provam. São flagrantes de câmeras com sensores. Até a onça-preta, a pantera brasileira, foi fotografada na Serra da Capivara. Treze animais já foram identificados, e a expectativa é de que sejam mais de 30 rondem na região. O biólogo Leandro Silveira comanda a expedição. Missão quase impossível em um pedaço tão selvagem do Nordeste do Brasil.
"Além de serem bastante raras, a região é de difícil visualização. É extremamente difícil visualizar uma onça andando em um ambiente desses. Nós temos esperança de encontrar um rastro fresco o suficiente para que os nossos cachorros possam nos ajudar a chegar até o animal", declara o biólogo.
"Elas moram em tocas nas redondezas, difícil é encontrá-las", afirma o guarda-parque Júlio Filho.
É difícil penetrar na vegetação seca e espinhosa. O biólogo Leandro Silveira fica com o rosto todo sangrando. Todo cuidado é pouco também para os cachorros que farejam a onça.
"Na Caatinga, nunca foi estudado antes. É uma grande surpresa saber que esses animais vivem nesse ambiente", revela Leandro Silveira.
Mas parece que as dificuldades são esquecidas em nome da pesquisa e do trabalho. A prioridade é achar a onça, capturá-la para exames de laboratório, identificação e, depois, soltá-la de novo.
Os cachorros partiram em disparada. Um rastro fresco acabara de ser encontrado! "Pelo rastro, dá para saber se é uma onça-pintada porque é maior, mais compacto, mais preenchido. Os dedos são mais dondos. Dá para ter ideia de que é uma pintada", explica o guarda-parque João Leite.
"Ali na frente" pode significar uma distância de pelo menos oito horas de caminhada pela imensidão da caatinga.
A veterinária Mariana usa uma antena de rádio para tentar captar algum som dos cachorros, que têm coleiras com sensores, para serem rastreados.
O esturro da onça é quase um troféu para os pesquisadores. Foi possível captá-lo em várias reportagens do Globo Repórter no Pantanal, por exemplo.
Mas nas montanhas de pedra da Caatinga, a onça ainda é mais sorrateira. É difícil alcançá-la nos labirintos.
"A esperança não morre nunca. Nosso objetivo, como pesquisadores, é ir até o final dessa história. Nós queremos entender mais como essas onças vivem nesse ambiente e vamos até o fim", conta Leandro Silveira.
Os pesquisadores passaram quatro dias só vendo pegadas da onça. "Vamos encontrá-la, mas temos que lembrar que se fosse fácil qualquer um já teria feito há muito tempo", diz o biólogo.
"Na caatinga é difícil. Esse tipo de desafio ajuda a formar pesquisadores. A ciência avança justamente pelos caminhos ainda não trilhados. Eventualmente é importante para a formação de alguém que queira ser um cientista, enfrentar os problemas e descobrir as novidades", afirma o professor Jader Marinho Filho, da Universidade de Brasília (UnB).